Nação Falhada e Imortal

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Nação Falhada e Imortal


Ouvi há pouco Miguel Sousa Tavares classificar o nosso como um Estado falhado, o que me fez reflectir num outro tom sobre mais uma tragédia nacional trazida pelos fogos florestais.

Apercebi-me desta nova desgraça ao fazer zapping ontem ao final da noite e dei por mim a assistir, petrificado, à reportagem da CMTV - sim, da CMTV que eu me recuso a ver - em directo de Tondela, à porta do estádio onde há poucas semanas estive a ver o nosso Porto. Uma cidade cercada pelo fogo e relatos desesperados de várias pessoas que procuravam saber de familiares espalhados pelas aldeias do concelho foi o suficiente para me manter acordado quase até às três da madrugada.



Cedi por fim ao cansaço e à necessidade de acordar cedo com um último pensamento: estamos perante nova tragédia, e Pedrógão ainda foi só ontem. Infelizmente, confirma-se. Sinto muito por todos os que, inocentemente, estão a sofrer ou sucumbiram ao fogo.

Regresso à opinião de MST, para acrescentar: não é o Estado que é falhado, somos nós, todos nós, os cidadãos-eleitores deste quase milenar mas ainda adiado país. A nação é que é falhada, porque as lideranças são lideranças falhadas, os governantes são governantes falhados, eleitas por eleitores catatónicos e autistas, as instituições são instituições falhadas, a imprensa é uma imprensa falhada, os peritos opinadores são uns absolutos falhados e finalmente, porque cada um de nós, no que à mais relevante construção e participação cívica diz respeito, e também falhado.

Parece-me evidente que a responsabilidade assenta sobre muitos outros ombros para lá deste governo, seria ridículo pensar o contrário ao fim de décadas e décadas de incêndios, ano sim, ano sim. Esse é um argumento válido, simplesmente não suficiente para justificar em pleno o que aconteceu ontem ou antes em Pedrógão.

Uma sociedade - um grupo organizado de cidadãos... - elege os seus representantes em democracia para, lá está, os representarem, zelando pela prossecução do bem comum acima de qualquer outra coisa. 

Pedrógão foi demasiado mau. Sabe-se já, publicamente, que parte relevante dessa tragédia se ficou a dever a um cúmulo de falhas técnicas e erros humanos, por parte de quem deveria saber como lidar com estas situações e, com isso, zelar pela segurança do cidadão comum.

E se a informação já é do domínio público, significa que António Costa e o seu governo já há "muito" o sabiam. E se o sabiam, haveria um curso de acção possível para um governante honrado e comprometido com os cidadãos que deveria representar: assumir todas e cada um dessas falhas e demitir todos os por elas responsáveis.

Numa sociedade democrática viável, não interessa que o responsável/titular de um organismo que falha como um todo seja ele próprio directamente responsável por essa falha. NÃO! Basta que essa falha exista e seja suficientemente grave para que esse cargo deva obrigatoriamente passar para outras mãos, totalmente limpas desse evento. É isso que inspira a confiança das pessoas nas instituições.

Feita essa necessária purga democrática, seria tempo de começar, de imediato, o que tem de ser feito para que isto não se repita sendo evitável. Queriam comissões e relatórios de peritos, os mesmos peritos que há anos andam a ser ignorar, que as fizessem - como fizeram - mas rápido. E com consequências claras e publicamente anunciadas, com metas e prazos.

Como sabemos, nada disso aconteceu. António Costa fez o que faz melhor: desviou o assunto do essencial para o acessório, pondo todo o país jornalístico e "opinador" a falar do que não interessa. Não houve culpados que não fossem os fenómenos naturais e os governos passados. Mesmo que os relatórios os apontem sem (ou com ligeira) hesitação. 

E como nada fez, expôs-se aos caprichos dos incendiários e da Natureza e deu-se mal: ontem voltou a acontecer uma inconcebível desgraça.

Sejamos claros, é possível que, mesmo que este Governo tivesse feito o que lhe competia, o que aconteceu ontem tivesse acontecido na mesma. É possível, sim. Porque não se resolve num par de meses um problema estrutural com muitas ramificações a necessitarem de intervenções de fundo.

No entanto, SE o governo de António Costa o tivesse feito, poderia agora, justamente, defender-se com esses mesmos argumentos - os fenómenos naturais e as omissões passadas. Como não o fez, passa a ser o primeiro réu, que deve (só pode) ser julgado pelos seus crimes.

Estou desde ontem à noite a ouvir jornalistas, comentadores, observadores e paineleiros doutores a pedir a cabeça da pobre ministra, como se esse acto sacrifical pudesse devolver algum sentido de Estado ou até algum closure à situação. Não pode, porque não chega.

E por isso, interrogo-me, pasmado: como é possível que ainda ninguém tenha pedido a demissão do próprio governo na pessoa de António Costa, o primeiro e último responsável político pela situação

Como é possível que hoje não tenham existido gigantescas manifestações cívicas nas principais cidades do país a exigir responsabilidades aos nossos eleitos?

Como? Ah, já sei - e o Miguel também: somos uma valente e imortal nação falhada. Que alguém tenha piedade de nós, porque nós claramente não temos.



Do Porto com Amor,

Lápis Azul e Branco




13 comentários:

  1. E na era da inteligência cibernética e dos mil e dois gadgets, acabo de ficar quase contente. Porque chove. Para que lado é Marte?

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  2. Marta Soares. 'Acredito que haja uma organização terrorista a incendiar o país"

    Este artista não está há mais de um "século" a dirigir os bombeiros? Quem ficou sem nada, queixa-se que nem um bombeiro viu. E a culpa é da ministra!

    "O lançamento de fogo de artifício na noite de domingo, durante os festejos dos Santos Mártires, no bairro do Alboi, em Aveiro..."

    O Presidente da Câmara é um gajo porreiro.... Fogo!?! A culpa é da ministra.

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    1. Há muitas culpas, repartidas por muita gente. Mas os titulares dos cargos políticos que tutelam esta área serão sempre responsáveis, precisamente por isso.

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  3. Uma sociedade - um grupo organizado de cidadãos... - elege os seus representantes em democracia para, lá está, os representarem, zelando pela prossecução do bem comum acima de qualquer outra coisa.

    Eu acho que somos é uma claque ilegal!

    A minha profissão obriga-me a, sobretudo, percorrer o norte do país. É tudo muito lindo com vivendas á la suisse e piscinas á Hollywood, mas 10 metros ao lado o mato e a porcaria grassam a olhos visto!
    É tudo muito lindo ver que no Monte Córdova o pessaol apressou-se a reflorestar a área ardida com milhares e milhares de jovens... eucaliptos!
    É deveras trágico e comovente ver alguém aos gritos a gritar que não há um unico bombeiro (como se fossem artigos que acabaram de esgotar no hipermercado!), quando as suas leiras (pedaços de terreno no mrte de Portugal, quase em geral ás escadinhas), em vez de agricultura dão lugar a silvas, fetos e... colchões velhos!
    É civilizado conduzir de janela aberta, já que estão mais de 30º, e "amandar" a beata janela fora, não vá sujar-se o cinzeiro do carro!

    Realmente é como diz o anónimo... a culpa é da ministra! E vá lá... somos um grupo organizado de cidadãos!

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    1. Coincidências Gilberto. Coincidência só arder o Centro/Norte do país. Coincidência o Sócrates não ter sido triturado por aquele paspalho de jornalista. Coincidência o país voltar a arder, após deputados fazerem uma imensa berraria pela geringonça estar a dar certo.
      Coincidência ressuscitarem o cadáver de Francisco Assis.
      Coincidência esse Marta Soares estar sempre nas TVs a pedir milhões, meios (muitos$$$), governadores civis, substituição de SIRESPs.
      Coincidência o juiz não dar provimento às pretensões do clube do regime bafiento e ter de se marcar a agenda com assuntos ainda mais graves para abafar o ruído.
      Agora que chegou Marcelo é tempo de discursos, beijos, abraços e bonecos enternecedores.
      A corrente é manifestações silenciosas para que a ministra se demita!
      Manifestações para que a Ascendi, a Brisa, etc., cumpram a legislação existente sobre as regras de segurança, não se marcam espontâneamente.
      Manifestações para que os presidente de Câmara cumpram as suas funções, zero!
      Manifestações para que se respeite nas autarquias o Plano de Ordenamento do Território, vai no Batalha.
      Claro que depois, uma vedeta televisiva da SIC, sem qualquer tipo de pudor que publica o nome dos desgraçados falecidos atribuindo a sua morte à ministra, é aplaudido até com as nádegas e elevado à categoria de herói.
      Também por isto somos uma país falhado.

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    2. Pela primeira vez, Felisberto, não concordo consigo. Eu também ando pelo país, pelo norte e especialmente pelo centro e já há muito que sei que o país-lisboa esqueceu o centro e esqueceu o norte. As gentes do centro desenrascam-se por si. E, as do norte também. As vivendas e as piscinas, e ao redor lixo, representam o que o estado não lhes deu, e deveria ter dado: - a educação e instrução! E, assim sendo, a culpa é dos ministros e dos primeiros ministros, que pouco me importa se chamem, Maria ou Mário, Adosinda ou Aníbal... E, sim, neste caso especial e estando por dentro da informação meteorológica e do que tinha corrido mal em Pedrógão enfiaram a cabeça na areia ! E são responsáveis !
      E é óbvio que vamos ao Hospital à procura de um médico quando nos sentimos doentes, os que temos cuidado com a saúde e os que não temos ! Pela mesma razão temos direito a pedir um bombeiro quer limpemos ou não as leiras !!
      Não há como desculpar a incúria do estado ! nem o esquecimento a que as povoações foram entregues !

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    3. Somos é um grupo amorfo e alienado de cidadãos ou isto jamais passaria sem a queda do governo em funções e marcação de novas eleições. E mesmo que assim fosse, tanto que ficaria por exigir e fazer...

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  4. Incendiários confirmados, todos os dias são vistos: Correio da Manhã, TVI, A Bola, SIC. Não me lembro do governo de PPC fazer algo para deter estes criminosos. Pelo contrário, ainda lhes fornecia gasolina para queimarem quem não lhes agradasse.

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    1. Esses são de outro tipo, mas de efeitos também nada negligenciáveis.

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  5. Em cada treinador nosso há um Lopetegui ou um JJ.
    https://www.youtube.com/watch?v=EHaGyi7o15c
    Resultado enganador pelos 2 golos marcados das poucas vezes que lá fomos e aquela sensação que passa para o exterior do treinador querer sair dali aos 60 minutos.

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  6. Olhe, caro Lápis, aproveito só para partilhar este texto consigo. Pode parecer que não tem nada a ver com o assunto, mas até tem. Obrigado pelo seu tempo. :)

    "Eu perdi.
    Perdi. Perdi tudo. Perdi vida. Perdi vitalidade. Perdi juízo.
    Perdi o rumo. Não sei para onde vou. Não sei o que quero, pois sinto-me dividido.
    Tenho uma parte de mim que nem sabe o que há de fazer, não sabe para onde devo ir, não me sabem colocar nos carris em direcção ao futuro. Outra parte anda perdida, inquieta, de mãos ao ar, sem saber o que fazer.
    Nenhuma das duas partes se entende. E eu estou confuso. Uma confusão.
    E entretanto, eu vou adoecendo. Dia-a-dia. Vou perdendo vida. Vou sendo cada vez mais um monte de cinzas.
    E choro. Choro. Choro porque perco a esperança. Choro porque a minha cabeça é teimosa, tem neurónios teimosos que querem servir-se a si e não me ajudam a pensar. Mas o meu corpo, as células do meu corpo não desistem. Resistem. Mesmo que entre si se chamem acomodados.
    É isto. Eu não sei o que quero. Nem sei para onde vou.
    Mas estou velho. Tenho a bela idade de 800 anos.
    Quero que me ponham nos carris. Quero que me ponham nos eixos.
    Eu assim o exijo.
    Eu, que sou PORTUGAL."

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