novembro 2018

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

O Porto de Conceição


Estava mortinho que este jogo acontecesse (e acontecesse assim!) para poder finalmente tecer as justas loas a Sérgio Conceição. Quem me segue sabe dos muitos reparos que lhe fui fazendo, a maioria de pormenor mas uma mão deles bem relevantes. Sinto-me por isso bem à vontade para o que agora vou escrever.




À quinta jornada, o Porto garantiu o primeiro lugar do grupo da Champions. O Porto, este Porto de Sérgio Conceição, está nos oitavos com uma jornada ainda por cumprir e no lote dos primeiros classificados no sorteio que há-de vir. Sob qualquer ponto de vista, resume-se numa palavra este desempenho: brilhante.

Não me esqueço nem por um segundo da muita "sorte" que tivemos nos primeiros quatro jogos: o penálti caído do céu em Gelsenkirschen, os inúmeros desperdícios dos turcos no Dragão e igual dose - a dobrar - no confronto duplo com os russos, somando-lhes ainda a penalidade defendida por Casillas. Em todos esses quatro jogos fiquei com a sensação que facilmente o desfecho final poderia ter sido diferente. Poderia... mas não foi.

Até porque me lembro bem do que "foi" Conceição na fase de grupos do ano passado - o ano da sua estreia na competição. Evoluiu depressa e bem, como se lhe exigia. Mas não é para todos, é só para quem tem essa capacidade.

Regressando ao presente, uma série de quatro jogos já tem de servir como "prova" de que há mais (bem mais) do que apenas ter caído nas boas graças da Dona Fortuna. Esta equipa está transformada num grupo muito resiliente, persistente e inamovível na persecução dos seus objectivos. Parece ter sempre seis vidas extra para sobreviver a cada uma das armadilhas que lhe são colocadas no caminho. E isto, meus amigos, mais do que outra coisa qualquer, é mérito do treinador.

Recuemos até ao defeso. O grupo a caminho do estágio em Portimão, convulsão interna, reforços que nunca o chegaram a ser e a conversa decisiva com o presidente. Conceição soube controlar a sua fúria e entender que o melhor caminho - o único caminho - era este, o de seguir viagem com aqueles que tinha à disposição, mas ainda assim sem permitir que outros sem qualquer valor acrescentado (na sua óptica) viessem para fazer número.

Engoliu em seco, contou até dez (milhões?) e seguiu em frente. Perdeu dois jogadores nucleares na defesa e apenas recebeu Militão em troca (até ver, pelo menos). Na direita, só há mesmo Maxi e em algumas ocasiões Corona pode chegar.



Início tremido, derrota caseira com o Guimarães e futebol pouco esclarecido, com poucas soluções para chegar às balizas contrárias. De vitória em vitória até à desesperante exibição que se concluiu com a derrota na Luz. Ponto mais baixo, disse Sérgio. E bem. Foi mesmo, mesmo rasteirinho. 

Aboubakar de fora por vários meses, Soares fora da Champions por má decisão técnica. Só com Marega na frente e André Pereira como enésima opção, a equipa conseguiu este registo próximo da perfeição nestes cinco encontros, sem com isso ter de sacrificar qualquer outra das provas em que está envolvido: liderança no campeonato, apurado na Taça de Portugal e "vivo" na da Liga. E com a Supertaça já conquistada, convém não esquecer.

Nada disto é especialmente diferente do que se exige sempre neste Clube, mas a diferença entre a exigência e a realidade tem sido bem significativa, tal como as quatro épocas antes eloquentemente comprovam. E é aqui que Conceição tem o seu imenso mérito: o de voltar a fazer coincidir as expectativas com a realidade dos números. 

Sobre a conquista da época passada já tudo foi dito, em relação ao que irá suceder nesta ainda é cedo para dizer em definitivo mas uma coisa é certa: tudo o que de positivo vier a suceder terá como principal responsável o nosso treinador. Insisto, o nosso treinador, não a "nossa" administração e nem o nosso presidente.

Sem Ricardo Pereira e sem Marcano, com Herrera outra vez "Errera", Telles eclipsado, Oliveira de volta à penumbra e sem Aboubakar. Logo no final da época disse em entrevista que este ano iria exigira mais a Corona e Otávio. Dito e feito, ei-los que nos enchem de golos, assistências e ainda mais esperança. E o craque Militão, que o é mas ainda agora chegou. E Maxi a dar tudo o que já não tem. E Óliver a tentar provar que merece mais. Isto, meus amigos, é "só" trabalho da equipa técnica.

Desde que a época começou e até aqui chegar, já muitos (poucos...) cabelos se esbranquiçaram à custa do bom do Sérgio. As exibições cinzentas, as vitórias sofridas e as tiradas descabidas. Destaco obviamente a rábula dos pseudo-adeptos, do Sá da Bandeira e quejandos: num primeiro momento profundamente errado e a dar nota de não saber lidar com a (justa) crítica, o treinador não tardou mais do que uns dias a ter a inteligência e o bom-senso de recuar, reduzindo ao mínimo o tom da contenda e assim pondo ponto final nesse não-assunto. Parece óbvio agora, mas na altura não seria tanto. 

E assim conservou atrás de si todo o Mar Azul, ciente do muito que havia conquistado e esperançoso no muito que ainda há para conquistar. E assim, já a entrar em Dezembro, seguimos. Felizes, líderes, esperançosos.



Notas DPcA 

(por ordem cronológica)



Dia de jogo: 31/10/2018, 19h00, Estádio do Dragão, FC Porto - Varzim SC (4-2)




Jogo bem mais acidentado do que se previa, com o Varzim a conseguir molhar a sopa por duas vezes (a última delas graças a uma mega-oferta de Sérgio Oliveira). No final, a vitória que se exigia apesar do susto. Na memória perdurará apenas a jogada mágica de Corona que ofereceu o golo a André Pereira.

Nota (8): Corona (>45')

Nota (7): Bazoer (<77'), Otávio, Soares (>65'), André Pereira

Nota (6): Vaná, Mbemba, João Pedro (<65'), Hernáni, Adrián, Óliver (>77')

Nota (5): Chidozie, Jorge (<45'), Oliveira

Sérgio Conceição (6): Deu lugar aos menos utilizados (e bem), apesar de ter exagerado na quantidade. Uma equipa que nunca joga junta (treinar não é jogar) não pode ter rotinas e nenhum adversário se pode menosprezar hoje em dia. No final, cumpriu o objectivo e por isso ganhou a sua aposta. Mas mais cuidado de futuro.


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Dia de jogo: 03/11/2018, 18h00, Estádio da Madeira, CS Marítimo - FC Porto (0-2)



Jogo tradicionalmente complicado e que se foi complicando ainda mais à medida que o cronómetro avançava (e muito pela nossa inabilidade) até que o desespero se parecia ter instalado com o penálti infantilmente desperdiçado por Marega.

Felizmente nas estrelas estava escrito um final feliz e quase foi preciso um prospecto para poder apreciar a obra de arte colectiva de onde resultou o primeiro golo do encontro, magnífico. O maestro foi Otávio, vindo do banco. Vitória muito importante e totalmente merecida.

Nota (8): Otávio (>67')

Nota (7): Militão, Danilo, Brahimi (<79'), Marega

Nota (6): Iker, Felipe, Óliver, Corona, Soares (<74'), Herrera (>74'), Mbemba (>79')

Nota (5): Maxi (<67'), Telles


Sérgio Conceição (7): Mais de uma hora de jogo nada brilhante que no entanto não comprometeu objectivo último dos três pontos. Bem ao "não deixar" a equipa esmorecer após o penálti falhado, mexendo de imediato e de forma decisiva com o lançamento de Otávio. Se a vitória esteve em dúvida, foi Conceição quem mais ajudou a desfazê-la.


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Dia de jogo: 06/11/2018, 20h00, Estádio do Dragão, FC Porto - Lokomotiv (4-1)



Outra exibição no "limite" com a fortuna a favorecer-nos uma vez mais. O Lokomotiv teve várias oportunidades para fazer duvidar o desfecho até final mas acabou por as desperdiçar. Ainda bem para nós, que assim seguimos na liderança do grupo. Reconfortante e merecida a standing ovation ao herói da pátria Éder.


Nota (7): Iker, Danilo, Herrera, Óliver (<84'), Brahimi (<68'), Corona (<77'), Marega, Otávio (>68')

Nota (6): Maxi, Militão, Felipe 

Nota (5): Telles, Hernáni (>77')

Nota (-): Oliveira (>84')

Sérgio Conceição (7): Outro jogo a demonstrar o quanto o treinador evoluiu a este nível, procurando dotar a equipa dos fundamentais equilíbrios em todos os momentos. Nada de euforias, nada de loucuras, saber jogar com o relógio e com paciência deu os frutos desejados. Ainda que pudesse ter sido diferente o resultado... só que não foi.


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Dia de jogo: 10/11/2018, 20h30, Estádio do Dragão, FC Porto - SC Braga (1-0)




Bom jogo de futebol, do melhor que se tem visto por cá, com a fortuna de novo a sorrir-nos no final. Abomino o estilo de Abel mas devo reconhecer que a sua equipa fez um belo jogo no Dragão e que, com a tal sorte do seu lado, até poderia ter vencido. O empate nunca ficaria mal a nenhuma das equipas. Felizmente ganhámos nós e assim passamos a líderes isolados do campeonato. Como mais gostamos de estar.

Nota (8): Soares

Nota (7): Iker, Militão, Danilo, Óliver, Brahimi (<72'), Corona (<64') Otávio (>63')

Nota (6): Maxi, Telles, Felipe, Marega (<89'), Herrera (>72')

Nota (5): Hernáni (>83')


Sérgio Conceição (7): Boa postura desde o início, ainda que o jogo jogado nem sempre lhe tenha feito justiça. O melhor foi mesmo quando decidiu mexer, porque foi assim que desbloqueou o impasse e ganhou o jogo. A equipa "soube" resistir às boas investidas do adversário e acabou com xeque-mate. Que bela é a vida...


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Dia de jogo: 24/11/2018, 20h45, Estádio do Dragão, FC Porto - CF Belenenses (2-0)



Jogo de taça... desta vez o treinador foi mais prudente e reduziu a quantidade de mudanças no onze. o que se notou na fluidez do jogo colectivo, muito mais próximo da nossa normalidade. Vitória segura rumo à eliminatória seguinte e sempre com o Jamor em fundo.

Nota (7): Adrián, Óliver (<86'), Corona, Soares

Nota (6): Fabiano, Telles, Militão, Felipe , Herrera, Otávio (<66'), André Pereira (<76')

Nota (5): Oliveira (>66'), Marega (>76')

Nota (-): Mbemba (>86')

Sérgio Conceição (6): Sem deslumbrar e sem tremer, a equipa assegurou o único objectivo da partida. Missão cumprida.


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Dia de jogo: 28/11/2018, 20h00, Estádio do Dragão, FC Porto - Schalke 04 (3-1)



O jogo que o treinador classificou como o mais complicado do grupo - não o sendo, entende-se bem o propósito. Era o que bastava para garantir o apuramento em primeiro e assim ficar melhor posicionado para o sorteio dos oitavos, feito raro para as equipas deste rectângulo do vale-tudo. Jogo bem encarado, sem precipitações ou ansiedades prematuras e as coisas acabaram por acontecer com alguma naturalidade, depois de uma vez mais a equipa saber resistir a alguns momentos complicados.

É a tal da resiliência, do "calo" que vai crescendo na mentalidade deste grupo. Tudo pode ser possível, se trabalharem para isso. E uma equipa que acredita nisto é sempre mais difícil de derrubar. E a estreia do menino-craque a marcar na Champions a ficar para a posteridade.

Nota (8): Militão

Nota (7): Iker, Danilo, Corona (<79'), Marega

Nota (6): Telles, Felipe, Herrera (<85'), Óliver, Otávio (>79')

Nota (5): Maxi, Brahimi (<74') Adrián (>74') 

Nota (-): Hernáni (>85')

Sérgio Conceição (8): Nova prova de maturidade (prematura) do treinador, demonstrando que claramente entende como se disputa e se vencem jogos nesta competição. Claro que fomos felizes, mas desta vez sem nada de muito relevante e de que o adversário se possa queixar (a não ser de si mesmo). Este jogo e esta vitória foram o corolário de uma campanha quase perfeita e a nota também reflecte isso mesmo. Parabéns mister.


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Termino voltando à resiliência. É mesmo disto que os campeões, os vencedores das corridas de fundo são feitos. Sobretudo os que à partida não sugeriam grande capacidade para o ser. Sérgio Conceição não é perfeito - longe disso - mas foi o melhor que nos poderia ter acontecido neste momento do tempo. Por isso e quase só por isso, um outro e renovado agradecimento ao presidente Pinto da Costa por ter voltado a acertar ao fim de tantos falhanços sucessivos. 

Siga para campeonato, na batalha campal do Bessa. Lá estarei, como sempre.



Do Porto com Amor,

Lápis Azul e Branco






quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Manuel, o Triste Bárbaro


Como se não bastasse a irritação solene que aquela postura de pavão recheado me provoca, eis que o bom senhor resolveu dar um passito mais fora da sua dourada reforma parlamentar e voltar a eriçar-me os pêlos.




Corria o mundo na sua louca normalidade, entre as diarreias twittícas de Trump, os afectos agora um pouco menos afectuosos do Senhor Presidente e a invertebrada bonacheirice do actual rei absolutista dos lusitanos, D. Costa I, quando o triste do Manel se lembrou de nos lembrar que ainda está aí para as curvas, prontinho a seguir em frente em cada uma delas.

No sempre democrático modo da "carta aberta", o camarada veio desafiar D. Costa a usar de trela curta na sua nova ministra de Cultura, a tal que teve o desplante de traduzir em proposta de lei algo que a esmagadora maioria dos portugueses pensa: as touradas são uma barbárie bafienta, importada de um tempo onde a amada democracia do Manel nem era ainda sonhada neste canto do planeta, carregada aos ombros de meia-dúzia de "aficionados" e que portanto não justifica qualquer tipo de benefício ou ajuda por parte da sociedade como um todo. 

São uma minoria sim, mas não das que necessitam de protecção suplementar; são antes uma "seita" sádica a quem falta coragem para espetar bandarilhas nas costas dos familiares e vizinhos, canalizando para os touros essa frustração.

Atente-se que a ministra não veio propor a proibição da tourada - isso sim, seria motivo de legítima e saudável contestação por parte do Manel e demais tristes, ainda que perfeitamente justificável a discussão - mas apenas defender que o cruel "espectáculo" não beneficiasse de uma taxa reduzida de IVA, a par dos verdadeiros espectáculos culturais. 

Pois não só deveria ter taxa máxima de IVA, como uma sobre-taxa especial. Uma não, dez. Todas as reverter para associações de acolhimento e tratamento de animais vítimas de abandono e maus-tratos, fundos ambientalistas e afins. E mais, já é tempo de o Governo, um qualquer governo, pôr fim ao nojento apoio e palco que a televisão pública dá às touradas. Querem televisão, que se fundam todos no seu próprio canal, privado e suportado por quem gostar da carnificina.

Ou então que se dê a todas as "meias-dúzias" de cidadãos a possibilidade de recuperar velhas tradições culturais, como as lutas de cães ou de galos, a tortura dos opositores, a fogueira dos hereges, o apedrejamento das adúlteras e tudo o que lhes der na gana. Afinal, há que preservar as "liberdades pessoais" como o Manel as entende. Olha, por exemplo, aqui na minha rua somos uns quinze fanáticos por um "desporto" muito peculiar, o espancamento de deputados que voluntária e repetidamente vilipendiam o erário público - teremos direito a taxa reduzida no IVA? Ou a practicar o desporto, pelo menos? Serão os touros menos dignos de protecção que esses animais?

A liberdade do Manel termina onde começa a minha e vice-versa. Tem, portanto, todo o direito de querer touradas e eu de não as querer. Em democracia, debatem-se os pontos de vista e depois vota-se: e ganha a maioria. O "velho resistente" estará porventura a ficar demasiado velho, perdendo a noção do essencial que durante tanto tempo defendeu. Quer impor a uma imensa maioria algo que essa maioria não quer (e que vasta percentagem abomina), bem ao estilo Bolsonaro que sugere nascer destas "intolerâncias". O Manel continua a servir-se do faro, mas já com graves falhas na sua interpretação: cheira-lhe a totalitarismo, mas não se apercebe que é o seu próprio.



Do Porto com Amor,

Lápis Azul e Branco