Eu sabia. Eu sabia que tinha de haver outra razão para lá da merecida preguiça de férias para ter decidido adiar a crónica do jogo do Jamor e condensá-la na do jogo de hoje no Dragão. Eu sabia.
Isto de ser doentinho pelo Clube, antecipando a descida rumo ao paraíso só para parar a meio, no inferno, e ver o jogo do Porto, tem que se lhe diga. Fui, vi, sofri, injuriei e finalmente - sem saber bem como - festejei aliviado. Ainda não era dessa - à segunda jornada - que iríamos desperdiçar pontos, o que somado ao facto de se tratar de uma deslocação que se tem tornado complicada, poderia dar alento e aumentar a crença de que devagar, devagarinho, lá íamos indo. Só que...
Só que, o que se passou no Jamor - corrijo, o que eu vi no Jamor - foi pouco menos do que assustador. A equipa escolhida do plantel campeão nacional, descontando dois ou três titulares essenciais desbaratados sem eira nem beira, teve um comportamento muito preocupante para o muito que se segue.
Mesmo com a sorte do jogo a soprar na nossa direcção, fomos incapazes de guardar uma confortável vantagem de dois golos, fruto de uma gritante incapacidade de controlar a bola e o jogo rápido do adversário (um bom adversário, diga-se, mas a lutar por uma época tranquila e pouco mais). O lance do segundo golo (estou ainda no Belenenses-Porto, ok?) é simplesmente uma inadmissível sequência de erros grosseiros, individuais mas também colectivo e sintomática de uma equipa à deriva, sem confiança no seu plano de jogo.
Como sabemos, no final tudo acabou em bem. O VAR deu-nos um penálti, da mesma maneira que tinha dado um ao adversário, e Telles teve a classe necessária para marcar o golo da vitória. Os três pontos foram para o Dragão, mas o amargo de boca ficou.
Fast-forward para esta noite desconcertada no Dragão, frente ao até então sem-pontos Vitória de Guimarães. Em teoria, um adversário na mó de baixo, presa ideal para mais uma festança em família com a casa cheia. Mesmo onze da semana passada (...) e vamos a isso.
Uma primeira parte sem grandes coisas para contar, para lá de um golaço de Brahimi e de um inacreditável erro da arbitragem ao validar o segundo golo ao estreante André Pereira, claramente em fora-de-jogo. Sim que a equipa esteve longe de ser brilhante, mas nem assim encontro respaldo para as "francas" declarações do treinador no final, ao carregar na tecla de que já na primeira parte as coisas não tinham estado bem. Não tinham, é certo, mas em que primeira parte desta época já estiveram? Houve assim uma quebra tão acentuada face as anteriores para merecer esse destaque? Não creio.
Quem assistiu, de forma privilegiada como Sérgio Conceição o fez, à segunda parte tenebrosa da sua equipa, só tem é de relevar o que aconteceu na primeira. O descalabro começou na burrice infantil de outro Sérgio, o Oliveira, que tal como na jornada passada, foi de longe o pior em campo e nem assim o treinador teve a inteligência de o mandar tomar banho mais cedo (muito mais cedo). Sim que as lesões alteraram os planos, mas mesmo ANTES delas já se justificava a "expulsão" do médio - demasiado fraco para jogar (para ser convocado) no Porto nesta forma actual.
Acreditem ou não, uns 10 segundos antes da burrice que deu o penálti e consequente 2-1, já eu pensava para mim mesmo que ia dar asneira da grossa. É que não é preciso muito mais que dois olhos e uns anitos a ver futebol para o intuir. E já vinha do Jamor, insisto. Num meio-campo assente em apenas dois jogadores (Otávio é um "extra", não vem de "série"), quando um deles simplesmente não rende, tudo se tende a desmoronar.
[Para quem não me lê há pelo menos uma época, esclareço que sou um dos "fãs" de Sérgio Oliveira, um dos poucos que nunca deixaram de acreditar que ainda poderia "dar jogador", como tal sinto-me perfeitamente à vontade para agora escrever o que escrevo]
Compreendo, até certo ponto, o dilema do treinador, quando olha para o banco e não vê nem um jogador com o "perfil" adequado para substituir Oliveira e pedir-lhe que assuma as mesmas tarefas; mas caramba, há um limite que se traça quando o "original" passa a comprometer a equipa lance após lance defensivo: aí, não tendo cão, é mesmo preciso ir ao saco de gatos e confiar que um deles acabará a latir.
Os outros dois golos sofridos foram exemplos do descontrolo e da desorganização que reinava na equipa. Vários erros individuais nas marcações e no posicionamento, dificuldade em reagir, incapacidade para deter a bola e/ou os adversários. Como se explica isto, em jogadores com a experiência de Maxi (falhou hoje e no Jamor)? Ou Felipe, que desde que soube que ia à Canarinha só tem metido água? Ou? Ou? Ou?...
Claramente, a equipa não está bem. Hoje, mal saiu Brahimi, o nosso íman de estimação, a equipa encolheu-se e perdeu a direcção da baliza adversária. Não por o argelino ser peça-chave no jogo colectivo, mas precisamente por ser peça-chave (e quase única, por estes dias) para individualmente manter uma mão cheia de adversários em sentido permanente. Sabendo-se da Maregodependência da época passada e da actual correspondente "ressaca", perder também Brahimi parece resultar no esmigalhar completo da equipa, perdendo o sentido colectivo e a necessária coesão para um bom funcionamento.
E por mais voltas que se dê - algumas bem justificadas, como a ausência de reforços, dignos do nome, para no mínimo compensar as saídas - é mesmo a Sérgio Conceição que devemos pedir explicações. O que se passa com a equipa, dentro da equipa, que possa explicar estas duas exibições tão, mas tão fracas?
Mais, o que se passa com o próprio treinador, que no Jamor tão mal mexeu na equipa? Má leitura do jogo? Achar que não tem soluções melhores no banco para o que pretende? Difícil de descodificar. Inegáveis são os factos. Por duas vezes a ganhar por 2-0, deixámo-nos empatar já perto do final. Na primeira, conseguimos vencer. Nesta segunda, acabámos inapelavelmente derrotados.
Parece-me que há uma conspiração momentânea dos Sérgios, ou melhor, contra os Sérgios. Os astros, os administradores e os adversários, todos se conjugam em conluio para lhes tramar a vida. E os pobres, atraídos pela luz brilhante, acabam por lhes fazer a vontade. Deixam-se levar, perdem o Norte e acabam a decidir mal, dentro e fora das quatro linhas.
A solução? O reequilíbrio. Parar para analisar e pensar. Reflectir. Concluir e depois fazer de acordo. Pode cair bem no goto do adepto aquela postura frontal e coisa e tal após a derrota, mas na verdade de pouco vale se a seguir não se for ao fundo das questões com o objectivo único de as resolver.
Esta equipa joga pouco futebol. E quando não tem a bola, parece não saber o que fazer, o que ainda assusta mais. Acredito que esteja tudo relacionado, faz sentido que assim seja. Mas já é tempo de encontrar o caminho, outro caminho e de o percorrer. Antes que seja tarde demais.
Em simultâneo, continuar "irredutível" a fazer ver à direcção que faltam jogadores de qualidade para várias posições. Mas ir fazendo pela vida com os que cá estão, just in case. Assim é muito pouco. Assim não chega.
Notas DPcA
(por ordem cronológica)
Dia de jogo: 19/08/2018, 18h00, Estádio do Jamor, Belenenses SAD - FC Porto (2-3)
Nota (7): Alex Telles, Herrera
Nota (6): Iker, Diogo Leite, Otávio (<73'), Brahimi (<81'), Aboubakar, André Pereira (<64')
Nota (5): Maxi, Felipe, Óliver (>73'), Corona (>64'), Hernáni (>81')
Nota (5): Maxi, Felipe, Óliver (>73'), Corona (>64'), Hernáni (>81')
Nota (4): Sérgio Oliveira
Sérgio Conceição (5):
Ganhou, é um facto, mas foi por pura sorte. Foi um tal de Capela que o
safou, que nos safou do empate, já em plenos descontos. Não se
compreende como é que uma equipa que recebe uma oferta adversária e se
apanha a vencer por dois logo no recomeço da segunda parte, se deixa
depois voltar a empatar já perto do final. Um autêntico hara-kiri de que
o treinador tem de ser o principal responsável.
Não compreendi a
"bondade" das duas últimas, não só pelos "nomes" mas pelos respectivos
momentos que o jogo atravessava. Creio que cada uma delas contribuiu
para agravar o estado da nossa equipa, sobretudo por subtrair Otávio e
Brahimi ao jogo, mantendo o morto-vivo Oliveira nas quatro linhas. Algo
vai mal na cabeça de Sérgio (ou na minha).
Outros Intervenientes:
Outro bom jogo deste Belenenses de Silas contra nós, nomeadamente na forma como alterou a equipa durante o jogo. Destaque natural para Fredy, mas houve mais quem desse nas vistas.
Vi
o jogo apenas no estádio e poucas repetições dos lances críticos à
posteriori, mas fico com a ideia de que houve uniformidade do VAR no
critério das grandes penalidades. Não que sejam lances iguais, mas o
princípio subjacente parece coerente. Na minha forma de ver futebol e
interpretar as leis, não marcaria nenhum deles, o que também me sugere
haver proximidade entre os dois lances. No restante, foi Xistra.
Dia de jogo: 25/08/2018, 21h00, Estádio do Dragão, FC Porto - Vitória SC (2-3)
Nota (7): Brahimi (<51')
Nota (6): Telles, Otávio, Herrera, Aboubakar (<62'), André Pereira
Nota (5): Maxi, Diogo Leite, Felipe, Óliver (>74'), Marega (>62')
Nota (5): Maxi, Diogo Leite, Felipe, Óliver (>74'), Marega (>62')
Nota (4): Sérgio Oliveira
Nota (-): Corona (>51') (<74')
Sérgio Conceição (4):
Mesmo filme, final diferente: desta vez foi de terror. Indo directo aos assuntos, porquê manter Oliveira em campo para lá dos 50 e poucos minutos, de tão flagrante que já era o seu desacerto e falta de pulmão? Porquê retirar Aboubakar do jogo, fosse a troca por quem fosse (sim, sofremos três golinhos desde a sua saída)?
O que explica esta fragmentação da equipa nos últimos trinta minutos dos encontros? Questões físicas? Mentais? E por que motivo temos sido fustigados com tantas lesões musculares, desde a Supertaça até agora? Não haverá aqui um padrão de treino com urgência de revisão? Muitas perguntas sem resposta (conhecida). Veremos o que se segue.
Outros Intervenientes:
Não sou capaz de alinhar no discurso dos parabéns a este Vitória de Luís Castro, que pelo que vi pouco mais fez do que aproveitar as escassas ocasiões que teve e depois resistir com a ajuda de todos os santinhos. Teve a sorte do jogo, depois de ter sido severamente prejudicado num golo pela arbitragem ausente. Não lhes tiro o mérito da resiliência, mas não me atirem com "vitórias justas" porque não foi o caso. O empate era o mais correcto.
Gritante o erro da validação do segundo golo, o de André Pereira, que depois se veio a saber devido a não ter havido VAR durante meia-hora. Coisas do arco da federação, já se sabe. Uma vergonha. O suposto penálti sobre JCT seria forçadíssimo, houve contacto mas de "ponta com ponta", nada que o derrubasse, acho acertada a decisão. Outros lances não posso comentar, porque não pude rever ainda.
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O Twitter, ah o Twitter. Quem acha que não há nada pior do que uma derrota caseira, que experimente navegar pelo pássaro azul nos momentos subsequentes. É vê-los, aos baluartes do portismo, a disparar alarvidades de todo o feitio e em todas as direcções. O meu top 10, injusto pelos outros 10 que mereciam igualmente estar na lista, mas enfim, a vida é tramada:
1) Pronto, já vêm (ou veem, FJM?) os abutres, os portistas de merda, criticar logo à primeira oportunidade [medalha de ouro, every time]
2) Agora é que temos de estar todos juntos, somos todos importantes, mar azul, sieg heil
3) A SAD é que é uma merda
4) Não, o treinador é que é uma merda
5) Não, não, os jogadores é que não valem nada: menos o André André e o Tozé, que faltinha nos fazem
6) E os gajos que comem pipocas no estádio? A culpa é deles, claro. Mais dos que saem antes de acabar, traidores!
7) Grande Vitória, derrota justíssima (mesmo perante stats que escancaram o oposto)
8) Isto sem o Marega não vai lá!
9) #MeteOMarega (e o Óliver)
10) Isto nem com o Marega lá vai!
Enfim, já desabafei também. Vou regressar às minhas férias.
Não vou, não, que isto não se evapora assim. Amanhã vou passar ainda mais tempo dentro do mar salgado, diz que desincha mais rápido. Depois confirmo.
Do Porto com Amor,
Lápis Azul e Branco