O Jogador-Empresa

terça-feira, 9 de junho de 2015

O Jogador-Empresa


Diz Casemiro que "Foi uma época positiva, mas faltou um título como recompensa pelo nosso trabalho. A nível pessoal, consegui ter uma boa sequência de jogos e desenvolver o meu futebol. Foi uma época muito positiva e produtiva para mim, tanto a nível tático como técnico".

Escolhi este moço por ser exemplo perfeito daquilo que pretendo abordar. Nada me move contra ele, tem as suas características enquanto futebolista de que se pode gostar ou não, mas pareceu-me ter mantido uma postura séria ao longo de toda a época e portanto, mereceu a camisola que vestiu.

A questão de fundo é que os jogadores de hoje são essencialmente isto, uma micro-empresa composta por futebolista, familiares, amigos e empresário, que tem como objectivo único providenciar o sustento de todas estas personagens, o que apenas se torna possível através do crescimento e da maximização da rentabilidade dessa mesma empresa.

Por isso concentra-se no "a nível pessoal" e no "para mim", que é o que realmente lhe interessa. Em último plano lá vem o parêntesis sobre o (in)sucesso colectivo, coisa de somenos importância para a Casemiro Inc.

O jogador do amor ao clube está morto e enterrado. Mas felizmente ainda sobrevive uma sub-espécie, a do "amor ao clube desde que me paguem o que eu quero", que é uma v2 do original, acrescida da inevitável componente empresarial.

Pode parecer o mesmo que o jogador normal (o mercenário puro e duro), mas definitivamente não é. Porque comporta o tal lado afectivo, emocional e de certa forma ainda espontâneo, que em muitas situações limite pode significar a diferença entre a derrota e a reviravolta, entre desistir ou lutar pela camisola até ao fim, entre ser ou não ser Porto.

Regressando a Casemiro, tal como outros compañeros suyos, veio para o Porto ao abrigo de uma nova e arriscada política desportiva (tantas vezes criticada e até gozada quando se tratava dos rivais de Lisboa), que se baseia em larga medida na importação por empréstimo de jogadores que falharam (por inépcia ou falta de oportunidade) em clubes de maior dimensão financeira. 

Correndo bem a época num clube como o nosso, a probabilidade de o quererem de volta na casa de partida é elevada e todo o trabalho e investimento em termos de adaptação, conhecimento táctico e modelo de jogo vai pelo cano abaixo, ou melhor, regressa com o jogador. Se correr mal, bom então poder-se-á pensar "ainda bem que não o compramos", mas o efeito perverso também existe porque esteve a ocupar o lugar de um jogador "nosso" (com grande probabilidade, um da formação) e tratou-se apenas de tempo perdido.

É certo que a chave para o sucesso desta política passará sempre pela negociação que é feita, em particular as cláusulas de regresso, opções de compra e penalidades associadas. No exemplo "Casemiro" temos um desfecho virtuoso, com o Porto a encaixar bom dinheiro por devolver um jogador que pertence a quem agora paga por ele (e ainda mais se o jogador for agora vendido), mas no fundo o que o Real Madrid está a pagar é a formação que demos ao moleque, pelo bom aproveitamento que teve neste ano "lectivo".

Portanto, a vertente financeira acaba por se sobrepor à vertente desportiva, pelos motivos já expostos. E isto de facto representa uma nova forma de estar do Porto, com a qual eu não me identifico particularmente, mas que já é utilizada por outros (sobretudo pelo Benfica) há mais de uma década.

Se no lugar dos Casemiros, estivessem jogadores perfeitamente identificados com o portismo, que sentissem o real peso de perder com os rivais de Lisboa, de não ganhar na Choupana minutos depois de o SLB ter perdido, será que o resultado desportivo seria diferente? Seria de todo possível a displicência demonstrada em Belém?





1 comentário:

  1. Agradeço ao autor a preocupação financeira com o Sporting. Não sei se o seu clube está muito melhor nesse aspecto.
    Mas no ano passado, o Sporting contratou Slavchev e Gauld, cada um por 2,7M€, o que é mais do que o salário de Jesus, que também não se sabe ao certo quanto é, e não vi ninguém preocupado com a questão financeira do Sporting. Foram custos que não foram rentabilizados.
    O FCP tem necessidade de vender jogadores todos os anos por questões de tesouraria de curto prazo, mas a comunicação social não questiona a "saúde financeira" do clube. O que diria a imprensa se Pinto da Costa tivesse contratado Jorge Jesus? Que era um génio. Já sobre Bruno de Carvalho, quer-se passar uma imagem negativa, recorrendo a entrevistas a todos os seus opositores internos.
    Em termos de troca de treinadores, o SCP dá um "salto" qualitativo grande.
    O que me preocupa é se vamos ter dinheiro para dar a Jesus jogadores de qualidade para que possa efectivamente "ombrear" com Benfica e Sporting e também como será o coabitação entre presidente e treinador, 2 personalidades vincadas e egocêntricas, que tenho receio possam chocar.

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